Adiei temporariamente minha ida ao fim do mundo. Eu tinha, guardado em segredo, um estilhaço de esperança para usufruir no caso de alguma sorte. Agora sinto ondas de calor durante o dia, tenho pensamentos suspeitos e quase me sinto livre. Estou convivendo melhor com a minha incerteza, uma vez que pude compreender que ela não irá embora, a não ser quando eu for também. Passei anos esperando o dia em que eu não duvidasse mais. Bobagem. Entendi definitivamente essa minha condição e, sinceramente, já não a desprezo mais. O que está em mim provavelmente deve ser mesmo meu, e eu sei que o tempo nos faz dono de todo tipo de coisa, inclusive das menos aconchegantes. Me apropriei finalmente da minha escassez. Se não sou capaz de sentir o mesmo amor todos os dias, o sentirei então da maneira que me cabe, pela metade. Amarei durante a noite prometendo a mesma intensidade para o dia seguinte e passarei a vida desonrando minhas promessas. O que me consola é que meus instantes são reais, mesmo que acabem depois, num dia próximo. Jamais me entreguei em vão e os futuros que prometi tinham em si a minha vontade de ser próspera. Tenho boas intenções e meus ímpetos são puros, quase infantis. Não é leviandade, é apenas uma deficiência pública: sou uma oferta efêmera e valho os lamentos de depois.
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