07/12/2008

a insanidade

e o tempo que também é assim e que é feito do que é feito de nós e tão somente nossa única matéria e composição a esperar, enganar, envolver. um homem-não-homem e invisível, decerto cinza, que espalha recados e some e nos trai. o tempo que não quero ter, o tempo que apresso, disparo e estaciono, em vão. um dono demente, autoritário e servil, que me manda ir embora, ficar, esperar e nos adianta segredos e coxixos vindouros do que não se vê. uma brasa espalhafatosa é o que o tempo é. irregular e desobediente, sem presságios, sem pistas, sem moldes. o próprio Deus que suspeitamos e não podemos apalpar. repentino é o tempo, sem previsões nos concede e dá e tira e devolve e foge para sempre. um afago nos cabelos hoje, outra morte amanhã. o abrigo da esperança, a temperança em seu recheio vasto e indizível, o único motivo de todos os motivos irreais que, por bondade ou trapaça, o tempo nos permite criar e poder nos manter cambaleando, ora menos, ora muito mais. é o que não avisa o número de dias ou de dores, cruel e sem negociações preventivas nos apodrece em cadeiras e janelas a esperar. o que nos sacode na boa surpresa de quem não acredita ou espera aventura nenhuma e se despede dos males, presente do tempo. um tapa na cara, uma porta trancada para sempre. para sempre e nunca mais. no ódio nos arrasta sem perdão e nos tortura, depois faz promessas que por vezes cumpri, por vezes mente. não temos tempo quando na verdade é apenas o que temos. no amor nos rouba, sem compensações futuras, e no inferno da desordem nos toma para ele, muda-se para dentro de nós, eternamente. depois muda de idéia e nos devolve, num dia à toa, vontades e langores já esquecidos, conformados. não há insultos nem agradecimentos, não existe razão ou rédea de sentimento algum, não podemos prometer, garantir, enfeitar. tempo ladrão, perdulário e altruísta. nosso espelho. assim nos vemos e só assim verdadeiramente somos e inventamos existir. o tempo é Deus, e só ele o é, não tenho dúvidas. manipulador de dias e madrugadas que nem chegam a acontecer, ou que duram muito mais e nos fazem acreditar que merecemos o êxtase que precede a gratidão. o meu tempo, o seu tempo e o tempo do mundo desde lá atrás até perder de vista, é tudo o que nos escapa e o que em nós parece durar, é somente o que temos e tão somente o que não temos. a reunião de todas as coisas, existentes ou não, todos os bens e todos os males não são de nossa propriedade, não assinamos embaixo de nada, não podemos, embora vivamos como se fôssemos de fato uma pessoa com indícios e medos e planos e doações. e o tempo, permissivo que é, nos aproxima de nossas supostas possibilidades, para depois, com distanciamento, termos tempo de sobra para nos arrepender ou querer mais. dou meu tempo, meu amor, faço ameaças e morro de vez em quando, para depois duvidar se realmente alguma coisa aconteceu, se mudei de lugar ou virei outra pessoa num espaço que não poderia de fato relatar com honestidade. já me entreguei sem precisar desistir, a noção temporária de que posso dar ou receber alguma coisa faz com que algumas perguntas não se ocupem de mim, não por ignorância, mas por amor e desejo de continuar eu mesma inventando meu próprios dias e calores que ainda quero sentir e oferecer.

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