03/06/2013

halley, número três

bateu a porta e não olhou pra trás. aos poucos tudo iria se apagar, como sempre acontecia. um ódio pequeno sempre insistia no começo, mas depois ia embora com todo o resto. não gostava de lembranças, não tinha em si intimidade alguma com o que passou. já havia estado com  tantas pessoas e nunca realmente se sentira com ninguém, nem com nada. e assim iria ser sempre, por destino ou escolha. melhor não pensar. continuou caminhando por aquela estrada e por outras depois. cruzou pontes e cada vez se distanciava mais, sem volta, sem memória. tudo era novo a todo momento, uma repetição infinita das mesmas escolhas não feitas. preferia os dias de chuva e o cheiro do que ia ficando pra trás. havia feito uma pequena lista de coisas e pessoas para se lembrar pra sempre, eram poucas e estavam escritas em forma de círculo num papel de carta antigo e infantil. às vezes, duvidava se esquecia ou só fingia não lembrar para que não doesse.  e nem sabia por que doía. não sabia, não sabia mesmo. certamente seria muito trabalhoso investigar as causas, portanto, preferia deixar como estava, e tudo seria somente no presente. quando reconhecia certos rostos na rua, mudava de calçada, e quando tudo ficava pesado demais, mudava de cidade, pra poder ser livre. mas não era livre. gostaria de ser e, portanto, fazia de conta, mas não era. e além do mais, qual vida não é uma mentira? se perguntava, esbravejando. gostava mesmo era de estranhos, brindava e dançava de rosto colado com eles em noites finitas. depois continuava indo embora, afastando a culpa. culpa de quê? não sabia também. e era por isso, por essa infinidade de perguntas incômodas e sem razão aparente que preferia estar sempre esquecendo, apagando rastros e marcas na pele. pode se dizer que conseguia, mas não sem desassossego, não sem chorar no escuro uma vez por semana. quem não tem passado pode ter futuro? questionava. achava que não. dessa forma, não se sentia em lugar nenhum, e não estava mesmo em lugar algum. mas quem está? pensava de novo. evitava longas conversas e certos caminhos, por preguiça e medo de exigências alheias e futuras. não iria, em hipótese alguma, dividir segredos, isto já estava decidido há muito tempo. então, simulava razões, marcava encontros que nunca iria e oferecia, vez ou outra, um amor calculado. só uma coisa era de verdade, seu nome, gostava tanto de seu nome que sobre isto não conseguia inventar. entendia que, neste mundo, para que pudesse ter qualquer coisa teria que se dar em troca e, assim sendo, preferia continuar indo embora.

2 comentários:

Nick disse...

Uau, estou adorando seu blog!

Nick disse...
Este comentário foi removido pelo autor.