Galápagos. Ele
pretendia ir para Galápagos. Não sabia ao certo onde ficava nem o que havia por
lá. Quem sabe construir uma nova vida, recomeçar, sei lá. Gostava do nome,
soava bem. Queria esquecer e, talvez, fosse o lugar certo pra isso, sem nomes
ou rostos pra identificar, sem a obrigação de se lembrar nem fingir gentileza. Um
lugar distante de si próprio, onde as histórias fossem as dos outros, nunca as suas.Gostava de vento e,
Galápagos, parecia ser nome de lugar que venta bastante, um clima fresco e agradável.
Poderia morar em um barco simples, pensava. Poderia escrever um livro pra
preencher o tempo e a cabeça, pra ajudar a esquecer. Esquecer exige tática,
empenho e dedicação diária. Um pouco por dia jogaria um pouco de si ao mar,
numa cena clichê de filme ruim, sem medo ou pesar.Quem sabe alguns
poucos novos amigos, ou apenas conhecidos, pra jogar conversa fora nas noites mais
quentes e dividir um peixe e algumas
doses.Precisava conseguir
chegar até Galápagos o quanto antes, o mais cedo possível deveria estar lá, a
tempo de não desistir. A demora arranca o sentido das coisas, dos pequenos
desejos aos maiores planos tudo se esvazia se o tempo passa demais. Talvez
precisasse de um mapa para se inteirar de sua rota. Um novo nome também poderia
vir a calhar. Gostava muito de seu nome, seria uma dor perdê-lo. Mas pensaria
nisto depois, quando já estivesse lá, em Galápagos.Faria uma lista de
tudo o que precisava ser esquecido, em ordem de urgência. Durante o dia se dedicaria
às lembranças menos doloridas e passageiras, as mais pesadas e insuportáveis trataria
durante a noite.Resolvido isto,
precisava agora tratar de comprar a passagem que o levaria ao seu destino, a
primeira passagem importante de sua vida. Até então, só havia feito viagens
inúteis e aborrecidas para lugares onde nunca quis estar de verdade. Agora era diferente,
ele partiria para Galápagos, sem chances de volta.Entendia a mudança
como uma espécie de morte, uma vez que morrer é algo que não se pode evitar ou
escolher. Estava pronto para dissipar para sempre histórias, pessoas, lugares, amores e
tragédias.Iria fotografar
Galápagos, pintar sua paisagem em telas frescas, desenhar o lugar num papel e
pendurar na parede, enfiá-lo de vez em sua rotina e memória. Durante o sono,
sonharia com Galápagos, como sonhamos com a casa da nossa infância.Precisava decidir a
data da partida e tomar coragem para não se despedir de nada e ninguém.Não responder
perguntas e permitir-se viver discretamente eram, desde já, os maiores benefícios
de Galápagos. O vento, o mar, o barco onde iria morar e o peixe fresco seriam a
recompensa. Queria e precisava esquecer, mas não sem reconhecer no ato certo
prejuízo, portanto, merecia, sim, ser recompensado, e nada melhor que a própria
natureza pra se encarregar disso.Estava deixando a
barba crescer, cabelo na cabeça quase já não tinha mais, mas a barba era
abundante, era só deixar seguir seu curso.Como serão os
habitantes de Galápagos, pensava, que cor tem o mar de lá, pensava de novo. É claro que poderia pesquisar a respeito
facilmente, mas não queria, estava muito decidido em sua escolha e tinha receio
que qualquer informação o desviasse. Mas sua cabeça ia sozinha tentando
adivinhar que horizonte e cheiro teriam seu futuro. Aliás, fizera isto a vida
toda até ali. Tentava adivinhar uma boa surpresa todos os dias, mas isso acabou
não resultando em nenhum tipo de acerto.Agora seria tudo
completamente diferente. Em Galápagos, fosse como fosse, a sorte ou o azar que
tivesse teriam novo cenário, não era capaz de vivenciar mais nenhum tipo de
emoção nesta terra pisada de agora.Que morresse em
Galápagos, que fosse feliz em Galápagos, que sofresse de dor ou ardesse de amor
em Galápagos. Qualquer coisa, qualquer espécie de coisa, mas que fosse em Galápagos.
Um comentário:
Adorei Ivana! Denso. Descreve sentimentos inexplicáveis, ao menos para mim. Beijão
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